sábado, 17 de outubro de 2009

Sports Psychology: Understanding and Influencing the Road to Success

Fonte: http://www.usta.com/USTA/Global/PlayerDevelopment/Sport_Science/all/117729_Sports_Psychology_Understanding_and_Influencing_the_Road_to_Success.aspx

Mais um estudo interessante baseado em entrevistas realizadas com grandes atletas.
Publicado no site da USTA (United States Tennis Association), o artigo que leva o mesmo nome do título deste post, dos autores Suzie Tuffey Riewald, Ph.D e Kirsten Peterson, Ph.D levanta a discussão sobre os principais aspectos influenciadores do desenvolvimento de grandes atletas.
No artigo os autores apresentam um trabalho de 2003 de Riewald & Peterson, do comitê olímpico americano, que entrevistaram ex-atletas olímpicos, pedindo-os para destacar cinco fatores que influenciaram positivamente em sua carreira e os cinco principais obstáculos que tiveram que ser superados.
Estes foram os resultados obtidos:
What factors positively influenced success?
Olympians were asked to identify five factors that had a significant influence on their athletic success. Following is a description of the top ten factors (the percentage of athletes who identified this as a factor influencing their success is provided in parenthesis).
Dedication and Persistence (58%): This related to the positive influence of the Olympian’s inner drive, desire, persistence, and commitment to achieving their goals.
Family and Friends (52%): This support or influence included financial and emotional support, instilling confidence, providing an introduction to the sport, and the provision of stability.
Coaches (49%): Excellent coaches throughout their development were identified as having a great influence on success.
Love of Sport (27%): Love of, and passion for, the sport greatly influenced success, often providing the necessary motivation to continue training in less than optimal conditions.
Training Programs and Facilities (22%): The opportunity to train with club, college, national level, or resident teams and access to programs and facilities was important.
Natural Talent (22%): A genetic predisposition or God-given talent played a role in athlete success.
Competitiveness (15%): A strong competitive nature and love of competition was identified as a factor influencing success.
Focus (13%): The ability to stay focused on goals and the task at hand, despite distractions, had a significant influence on success.
Work Ethic (12%): Hard work and a strong work ethic were factors that influenced success.
Financial Support (12%): The financial support from sources such as sponsorship, college scholarship, private donors, athlete grants, and fundraising contributed to success.
What obstacles had to be overcome to achieve success?
The second question asked Olympians to list up to five obstacles to their success. After reading the list, you’ll recognize that several of these obstacles are the “flip side” of some of the identified success factors, adding even greater strength to the importance of that factor.
Lack of Financial Support (53%): Some implications of lack of financial support included increased stress and insecurity, compromised training due to having to work, and inability to compete nationally and internationally.
Conflict with Roles in Life (33%): This related to conflict experienced in trying to balance/manage multiple roles including work, career, school, family, and athletic endeavors.
Lack of Coaching Expertise or Support (29%): This related to having coaches with limited knowledge or expertise as well as conflicts with the coach.
Lack of Support from USOC and NGB (22%): Issues with these organizations included a lack of mental preparation programs, no organization or encouragement, and being too bureaucratic.
Mental Obstacles (22%): This includes such obstacles as low confidence, perfectionism, and dealing with pressure.
Lack of Training/Competition Opportunities (20%).
Medical Problems (20%): Injuries, illness, and other medical issues, as would be expected, were perceived as an obstacle to athletic success.
Lack of Social Support (11%): Family, friends and peers who provided little or no support and at times even discouraged athletic pursuits were perceived as obstacles.
Physical Limitations (8%): Identified limitations included characteristics such as height, weight, strength and endurance.
Failure (6%): This related to a fear of failure and learning to deal with failure.

Estes são dados bastante interessantes. Principalmente por terem sido obtidos através da experiência de atletas olímpicos, que já puderam refletir e avaiar sua carreira de sucesso, atribuindo valor a todos estes aspectos.
Cabe agora, aos profissionais que trabalham diretamente com os atletas de elite ou em formação, ficarem atentos a cada um destes aspectos. Desta forma as condições de preparação poderão ser melhoradas e o potencial destes atletas desenvolvido em um ambiente mais favorável.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Uma Perspectiva da Dor

Quanta dor um atleta pode suportar durante uma prova? E por quanto tempo ele suporte se manter neste sofrimento?
Estas perguntas me surgiram durante a prova do mundial de Ironman, disputado no Havaí, neste último dia 10. Para aqueles que não estão familiarizados, o Ironman é uma prova de triathlon com as distâncias de 3800m de natação, 180km de ciclismo e 42km de corrida. Apenas pelas distâncias a prova já é um desafio imenso. No Havaí então, onde a final do circuito é disputada todos os anos, o cenário é ainda pior. Muito vento, umidade altíssima e calor insuportável ainda se juntam a um percurso difícil onde boa parte é percorrida em terreno desértico, passando inclusive por antigos campos de lava.
Para muitos atletas, estar no Havaí, em Kona mais especificamente, já é uma vitória, pois apenas os melhores atletas do circuito se classificam para esta prova. Terminar a prova já é um grande desafio e uma grande recompensa. Estes atletas sofrem, sentem dores, desconfortos, passam mal. Concluindo a prova em 9 ou 17 horas(tempo limite), não há quem não se supere.
Mas o que me impressionou nesta prova foram os super atletas, que terminaram a prova em pouco mais de 8 horas no caso dos homesn e em pouco menos de 9 no caso da campeã feminina.
Podemos dizer que estes atletas são profissionais e estão super treinados, e são os melhores do mundo, mas não podemos dizer que eles não sofrem. Suas declarações após a prova são impressionantes, falam de superação, de sofrimento, de dor, e de aprender coisas sobre os próprios limites que desconheciam.
É óbvio que para quem não está familiarizado com o esporte, correr uma maratona é um sofrimento, mas estes atletas correm a prova abaixo de três horas, um ritmo impressionante para quem já nadou e pedalou 180km. E este ritmo dói. O coração, o pulmão, as pernas, os pés, os ombros, fora os desconfortos estomacais, o diafragma contraído já por umas 5 horas, que começa a doer, as costas, os desconfortos de calor, bolhas, subidas e descidas, e tudo isso por quase 3 horas. Como é possível suportar tudo isso sem cair na tentação de diminuir o ritmo?
Em uma entreveista certa vez, o canadense Peter Reid (bi-campeão da prova) disse que algum tempo antes da prova em Kona ele se isolava do mundo treinando. Neste tempo ele dizia que resolvia todos os problemas, medos e dúvidas quanto a si mesmo, pois na hora da prova, neste ritmo insuportável, se qualquer coisa se pusesse em seu caminho, por menor que fosse, desviando sua concentração, ele não aguentaria. Lembrei-me dessa declaração quando, na prova deste ano, corriam lado a lado, na segunda posição, o campeão da prova e o terceiro lugar, em busca do então líder. Durante alguns vários minutos eles correram lado a lado, na mesma velocidade, com passadas idênticas em ciclo e amplitude e com a mesma posição do corpo, como se fossem sombras um do outro. A única diferença entre eles era a cabeça, e isso foi logo notado pela comentarista, ex-atleta, grande vencedora em Kona. Enquanto o campeão mantinha a cabeça firme, olhando apenas para frente, extremamente concentrado, seu adversário já parecia estar incomodado com outros fatores. Olhava para os lados, para a moto da fimagem, para os espectadores, para o relógio, como se não suportasse ficar dentro de si, com sua dor e seu sofrimento, e aos poucos foi perdendo o ritmo e ficando para trás.
Estas cenas ficam guardadas em nossa memória e a psicologia do esporte tenta explicar alguns aspectos que influenciam nestes estados. A concentração e o foco com creteza são dois dos aspectos muito importantes quando falamos neste tipo de dor, a dor de performance. Diversos são os elementos presentes em nossa cabeça durante uma prova como esta. Elementos que nos ajudam, como o controle do ritmo, a sensação do corpo, a frequência das passadas, respiração, foco nos objetivos, entre outros e elementos que nos prejudicam, como dúvidas, medos, desconfortos e outros pensamentos inadequados. Quando aprendemos a controlar estes pensamentos conseguimos ocupar nossa mente com aquilo que é positivo, nos colocando em um estado melhor, que irá favorecer nosso desempenho.
Mas existem diferentes abordagens pessoais em relação a estes momentos de dor. Existem pessoas que preferem o que chamamos de pensamento associativo, isto é, focar a atenção em si, no corpo, na dor e tentar combatê-la e suportá-la diretamente. Outros atletas preferem o pensamento dissociativo, onde a estratégia é desviar o foco de sua situação, pensando em outras coisas, tentando "esquecer" estas sensações ruins. Muitos atletas lidam muito bem com a dor de forma dissociativa, mas uma verdade é que independente deste método, a dor sempre volta.
Objetivos fortes também nos fazem suportar melhor estes estados. Metas bem definidas, trabalhadas e alcançadas nos dão confiança para continuar em busca dos nossos objetivos finais. E se estes valem realmente a pena eles serão mais fortes que a dor. Segundo o grande ciclista Lance Armstrong: “Pain is temporary. It may last a minute, or an hour, or a day, or a year, but eventually it will subside and something else will take its place. If I quit, however, it lasts forever.” Pensar portanto no objetivo final além da dor, nos leva a sempre estender um pouco os limites.
Esta dor é, portanto, aceita como parte inerente ao processo do treinamento e da competição. Ela é inevitável apesar de todo o treinamento desenvolvido e do nível do atleta, pois quanto mais treinado ele for, mais ele terá condições de ultrapassar seus limites. Assim como os limites do corpo são estendidos, os limites da dor também o são. E feitos impossíveis para grande parte da humanidade são simplesmente suportados pelos grandes atletas, as custas de recursos muito bem desenvolvidos, mas não menos sofridos e dolorosos.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Trazendo o futuro para perto

Com a escolha do Rio de Janeiro como sede dos jogos olímpicos de 2016, diversos atletas expressaram seu desejo de continuar competindo até lá. Além deles, inúmeros jovens ainda em fase de formação já sonham com o dia em que poderão disputar uma medalha olímpica dentro de seu país. É claro para todos a importância de um objetivo como este e a capacidade que ele tem de nos motivar, pelo menos, a tomar uma decisão e começar a trabalhar em função dele. Mas o grande problema é que ainda faltam sete anos para o início dos jogos do Rio. Podemos estar motivados hoje para competir, mas o que ocorrerá no meio do processo, quando o objetivo final ainda estiver distante, os treinamentos duros, cansativos e monótonos e os resultados não tão positivos?

Os ciclos olímpicos têm esta característica, um objetivo final normalmente muito distante do presente, que apesar de sua grande capacidade motivadora também apresenta uma grande dificuldade de preparação e disciplina. Mas este fato não se limita as olimpíadas, ele se repete constantemente em todas as modalidades e todos os níveis. Em modalidades específicas como a natação, a ginástica artística e o nado sincronizado o atleta se dedica a meses de treinamento para desempenhar em pouco tempo tudo aquilo que treinou, algumas poucas vezes por ano. No caso dos esportes coletivos, embora jogem semanalmente, são necessários inúmeros jogos para que um campeonato se decida apenas no final do ano, em um jogo final ou na soma dos pontos.

Tudo isto nos leva a uma importante questão da psicologia do esporte. Como manter motivadas as equipes e os atletas quando o objetivo final está tão distante do presente? ou mais precisamente: Como fazer com que estes objetivos possam estar presentes e reforcem diariamente o comportamento dos atletas?

Esta questão é tratada quando falamos em estabelecimento de metas e objetivos. Todos nós fazemos os nossos planos, temos os nossos sonhos e trabalhamos em função deles, mas quando conseguimos nos organizar de uma forma mais sistemática e racional, de acordo com nossas metas, tanto o controle do processo como a confiança no resultado aumentam e conseguimos trazer o futuro diariamente para nos motivar.

O primeiro, e mais fundamental passo, é descobrir, REALMENTE, qual o nosso objetivo. O que nos motiva? até onde queremos chegar? por que queremos isso? Em princípio estas questões parecem fáceis de serem respondidas, é óbvio que se perguntarmos para uma criança em fase de iniciação ou aprendizado de uma modalidade esportiva qual o seu sonho ela responderá que é competir nos jogos olímpicos. Mas um objetivo é mais que um sonho, é algo pelo qual queremos trabalhar. E como o trabalho aumenta a medida que os nossos objetivos se tornam mais ambiciosos, devemos nos perguntar se realmente estamos dispostos a trabalhar o necessário em função daquele objetivo. Isto porque assumimos uma responsabilidade em relação a ele e a nós mesmos, sob pena de fracassarmos e comprometermos nossa confiaça e nossa disposição para buscarmos novas metas.
As metas portanto precisam estar adequadas às nossas capacidades aspirações. Devem se relacionar a quem nós somos e o quanto queremos alcançar isto. Inúmeros são os elementos externos que podem nos motivar. Reconhecimento, atenção, fama, dinheiro, diferenciação, são alguns exemplos destes motivadores chamados de extrínsecos. Mas estes muitas vezes são motivadores mais fracos, pois em uma instância fundamental o esporte é um desafio solitário. A vitória está aos olhos de todos, mas a dor é invisível. Acordar cedo todo dia, suar, sofrer, sentir dor, suportar os momentos difíceis, isolar-se do convívio social, são processos que o atleta tem de vivenciar sozinho. Portanto, os motivadores, para serem realmente fortes precisam vir de dentro, formados em um compromisso consigo mesmo, de querer vencer, se superar, evoluir, de realmente querer trabalhar em função desta evolução, destes desafios, pois é este caminho que fortalece o atleta.
Desta forma, antes de simplesmente determinar os objetivos pessoais de acordo com o que se quer no momento, o que está na moda, na mídia, o que os amigos ou o grupo acham interessante ou valorizam, os atletas devem encontrar as suas próprias metas. Eles devem encontrar seus motivos e propósitos, descobrir o que os motiva a este desafio, externamente e fundamentalmente internamente pois apenas desta forma cada degrau a ser vencido poderá lhes dar direção confiança e motivação para chegar até o topo.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Características de um atleta mentalmente forte

Em um estudo publicado no International Journal of Sports Psychology, em 2007, os autores Jones, Hanton e Connaughton entrevistaram uma amostra de atletas campeões olímpicos e mundiais, alguns de seus técnicos e psicólogos com o seguinte questionamento:
Na sua opinião, quais são as características de um atleta mentalmente forte?
O que os autores estavam tentando definir era o termo Mental Toughness (força mental), que seria um diferencial competitivo destes atletas e que por serem supostamente mais fortes mentalmente, conseguiriam uma definição melhor do termo.
Analisando as respostas dos sujeitos os autores classificaram os resultados em 4 categorias. Atitude, Treinamento, Competição e Pós competição, estes estágios foram posteriormente divididos em 13 sub grupos. Os atletas mentalmente fortes teriam, portanto comportamentos específicos relacionados a cada um destes fatores e momentos.
A seguir, as características levantadas pelos atletas do Estudo:

1 - Atitude
1.1 - Confiança
1.1a - Têm uma confiança inabalável como resultado de uma consciência total de como chegou onde está.
1.1b - Têm uma arrogância interna que o faz acreditar que pode alcançar tudo o que se dispõe a buscar
1.1c - Acredita que pode vencer qualquer obstáculo que estiver em seu caminho
1.1d - Acredita que seu desejo e vontade irão resultar em atingir todo seu potencial

1.2 - Foco
1.2a - Recusa-se a ser seduzido por ganhos a curto prazo que possam ameaçar o alcance dos objetivos principais a longo prazo
1.2b - Têm a segurança de que alcançar suas metas esportivas é a prioridade número um em sua vida
1.2c - Reconhece a importância de saber quando se ligar e desligar do esporte
2 - Treinamento
2.1 - Usando metas de longo prazo como fonte de motivação
2.1a - Quando o treino fica duro, porque as coisas não estão indo bem, fica se lembrando das metas e aspirações e em porque está passando por isso.
2.1b - Têm a paciência, disciplina e auto-controle durante o treinamento necessário para o desenvolvimento de cada estágio que permita desenvolver todo o seu potencial

2.2 - Controlando o ambiente
2.2a - Permanece no controle e não sendo controlado
2.2b - Utiliza todos os aspectos de um ambiente muito difícil de treinamento a seu favor
2.3 - Levando-se ao limite
2.3a - Adora os momentos em que o treino realmente dói
2.3b - Aproveita as oportunidades de competir durante os treinos
3 - Competição
3.1 - Enfrentando pressão
3.1a - Adora a pressão da competição
3.1b - Se adapta e enfrenta qualquer mudança, distração e ameaça sob pressão
3.1c - Toma as decisões corretas e escolhe as opções certas que garantem ótimo desempenho sob condições de extrema pressão e dúvida
3.1d - Enfrenta e canaliza a ansiedade em situações de pressão

3.2 - Confiança
3.2a - Têm um compromisso total com a performance e o objetivo final até que se esgote a última possibilidade de sucesso.
3.2b - Não se abate com os erros e consegue se recuperar deles
3.3 - Controlando a performance
3.3a - Têm um “instinto assassino” para aproveitar o momento decisivo, quando sabe que pode vencer.
3.3b - Consegue aumentar seu nível de performance no momento em que mais importa.

3.4 - Mantendo-se focado
3.4a - Fica totalmente focado na tarefa em face às distrações
3.4b - Mantêm-se comprometido com um foco interno apesar das distrações externas
3.4c - Em certas provas, mantêm-se focado no processo e não apenas no resultado.
3.5 - Controlando pensamentos e emoções
3.5a - Mantêm-se conscientes de qualquer pensamento e sentimento inadequados e consegue modifica-los com a intenção de melhorar sua performance

3.6 - Controlando o ambiente
3.6a - Utiliza todos os aspectos de um ambiente competitivo muito difícil a seu favor
4 - Pós-competição
4.1 - Lidando com a derrota
4.1a - Reconhece racionalmente a derrota e identifica as possibilidades de aprendizado para seguir em frente
4.1b - Usa a derrota para se motivar para o futuro sucesso

4.2 - Lidando com a vitória
4.2a - Sabe quando comemorar e quando parar e focar no próximo desafio.
4.2b - Sabe como administrar o sucesso

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Grupos, Equipes e Atletas

Do que consiste um grupo? Como são formadas as equipes? Quando uma simples reunião de atletas e talentos passa a constituir verdadeiramente um time?
Diversas vezes nos perguntamos estas questões esperando compreender como estes processos ocorrem e como esta compreensão pode no ajudar a formar equipes mais eficientes e produtivas.
É normal acompanharmos no esporte a formação de equipes idealizadas simplesmente através da união de diversos talentos, e depois vê-las fracassando pelo simples fato de não conseguirem expressar coletivamente as potencialidades individuais de seus membros.
Não podemos ignorar a importância de um grande talento dentro de uma equipe vencedora, mas isto por si só não basta, e quanto mais interativa for a tarefa a ser desempenhada mais dependente das qualidades do grupo este atleta será. O Jogador de basquete norte americano Michael Jordan já disse uma vez, que grandes jogadores vencem jogos, mas apenas grandes equipes vencem campeonatos.
Mas quando podemos dizer que um conjunto de pessoas é realmente um grupo?
Existem alguns fatores necessários para chegarmos a tal afirmação. Em primeiro lugar precisamos considerar a questão dos objetivos. Eles precisam ser comuns a todos os membros da equipe. Embora cada indivíduo possa ter objetivos particulares, estes deverão estar submetidos ao objetivo principal da equipe. O trabalho de uma equipe irá, portanto, se estruturar em função do objetivo coletivo determinado pelo grupo. O Objetivo não apenas direciona os esforços da equipe, mas também estrutura suas relações. É em função dele que se discriminam os papéis de cada membro, se hierarquizam as funções e se distribuem as tarefas. Isto pode mudar em função do grupo, da modalidade e até do momento do jogo em que o grupo se encontra. Em um jogo de futebol por exemplo, os objetivos da cada jogada, de defesa ou de ataque, detrminam a funções dos jogadores (zagueiro, lateral, meio campo e atacante), seu papel na jogada (criar, apoiar, defender, dar segurança, distribuir e marcar) e até sua importância (atacante na jogada de ataque, goleiro na de defesa). Quando todos os sujeitos atuam de forma coordenada e estruturada em função dos objetivos comuns podemos dizer que temos uma equipe.
Como um grupo implica em uma reunião de pessoas, seres humanos, não podemos ignorar a importância das relações interpessoais no processo de sua formação. As ligações pessoais, emocionais e afetivas estão presentes em qualquer grupo e podem reforçar a coesão, melhorar a qualidade do ambiente e potencializar o trabalho da equipe. Entretanto, relações ruins podem prejudicar toda a organização alcançada e atrapalhar o seu funcinamento.
A equipe passa então por quatro momentos básicos em seu processo de construção. O primeiro deles é chamado de estágio de formação. Nesse etágio ocorre o agrupamento dos atletas, é onde eles passam a se conhecer, se testar e se desafiar. Cada um procura compreender o seu papel dentro do todo, sua importância e suas funções. Neste estágio também começam a surgir as lideranças e os sub grupos.
O segundo momento é o chamado de agitação, é onde surgem os conflitos primordiais. Desafios a liderança e ao controle do grupo, conflitos interpessoais, tentativas de afirmação e contestação ao controle e às regras impostas são comuns. Embora seja um momento desconfortável para as equipes e possa reaparecer a cada momento crítico vivenciado pela equipe (sequência de derrotas, resultados ruins), é de fundamental importância para a determinação dos papéis, desenvolvimeto das relações e para o ambiente do grupo. Dizemos inclusive que um grande problema é um grupo aparentemente sem conflitos, pois reprimidos, estes se tornam maiores e costumam aparecer quando a situação já está em um estado muito avançado.
O próximo estágio é o da normalização. Ele é resultado da solução dos conflitos da fase anterior e é o momento onde a coesão realmente se desenvolve. as disputas e transformam em cooperação, os papéis são definidos e as funções divididas e organizadas em função dos objetivos comuns. No último estágio, o de atuação toda esta estrutura desenvolvida é colocada em prática. Com os papéis determinados, os conflitos reolvidos e as relações estáveis a energia do grupo é canalizada com todo o seu potencial em direção ao objetivo determinado. O objetivo principal é o sucesso da equipe.
Alguns fatores contribuem para este processo de formação e ao fortalecimento da identidade grupal. O primeiro deles é a qualidade da comunicação dentro do grupo. A comunicação está presente em todos os estágios e momentos da formação do grupo, e pode facilitar ou dificultar o processo de acordo com sua efetividade. Ela tem a capacidade de resolver conflitos, determinar objetivos, organizar esforços, influenciar pessoas e motivar os membros a submeterem seus objetivos pessoais aos da equipe. Uma comunicação efetiva facilita qualquer processo que envolva relações interpessoais.
Valores, ideais e propósitos comuns entre os membros do grupo também são fundamentais para o sucesso de uma equipe. Valores são todos os elementos que os indivíduos consideram importantes, que querem obter ou manter, os objetivos das ações. Eles podem ser externos, como o reconhecimento e a fama, ou internos, como o orgulho ou a satisfaçõ de ter alcançado um objetivo por esforço próprio. Quando os valores dos atletas estão alinhados, quando cada um percebe a sua importância no grupo, sua contribuição pessoal para aquilo que é dele, do qual ele faz parte, a dedicação e o empenho aumentam e a tolerância às dificuldades é mais suportável.
Devemos então prestar atenção quando montamos ou conduzimos uma equipe, para não ignorarmos os processos inerentes a sua formação, achando que só porque estão treinando juntos os atletas formam um time. Grupos, equipes e times, exigem um trabalho e um cuidado constante, pautado na atenção às suas necessidades e às suas relações e desenvolvido através da comunicação atenta e cuidadosa na condução de seus processos.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Lesões Esportivas e a Psicologia do Esporte - Parte 3 (Estratégias de Coping)

Os trabalhos de intervenção com atletas lesionados se desenvolveram, em função da utilização das estratégias de enfrentamento do sujeito, também chamadas de estratégias de coping. Estas estratégias compreendem uma série de técnicas do treinamento psicológico, tanto de capacidades psíquicas, quanto de autocontrole, e visam proporcionar um estado psicológico mais favorável durante o processo de reabilitação.
Identificam-se duas formas distintas de coping, de acordo com o foco dos esforços do sujeito. No coping instrumental os recursos são focados no problema (a lesão e seu processo de recuperação). O atleta se concentra em seguir os protocolos de reabilitação com empenho e dedicação como se estivesse em seu treinamento físico normal. No coping emocional o foco é dirigido para a regulação das emoções estressantes, isto é, o esforço realizado busca conter as manifestações emocionais como raiva, medo e depressão, muitas vezes dissociando seus pensamentos do processo de tratamento.
A forma como o atleta percebe e enfrenta sua lesão pode influenciar na rapidez de sua recuperação e na adesão ao tratamento. Isto ocorre uma vez que a presença de reações emocionais adversas pode contribuir negativamente no processo de recuperação de uma lesão esportiva, afetando sobre tudo, a adesão apropriada às tarefas de reabilitação.
As principais reações emocionais identificadas neste processo são a raiva e confusão, a obsessão pelo retorno, a negação, as recidivas, o orgulho exagerado, a insistência nas queixas menores, a culpa por desapontar a equipe, o afastamento social, as mudanças de humor, o desânimo e falta de confiança na recuperação.
As estratégias de coping surgem como facilitadoras do processo de recuperação, buscando melhorar as atitudes do atleta perante sua lesão, aumentando a adesão ao tratamento e diminuindo o estresse e as respostas emocionais negativas.
Dentre as principais técnicas de coping instrumental estão a informação sobre o processo de lesão, o estabelecimento de metas, a autoconversação, a visualização, o relaxamento e o desenvolvimento do apoio social. A informação sobre o processo de lesão costuma ser a primeira estratégia utilizada após a ocorrência da lesão e, normalmente, é realizada pelo médico. Sua função é explicar ao atleta o que realmente ocorreu e como será seu processo de recuperação. São dadas informações sobre as causas da lesão, os procedimentos terapêuticos e o prognóstico de recuperação.
Estas informações fazem com que o atleta reconheça a importância de sua lesão, compreendendo melhor suas causas e mecanismos. Isto facilita uma visão mais prática e concreta desta lesão, oferecendo alternativas ao simples processamento das emoções eliciadas pelas dores físicas e psicológicas do atleta lesionado.
Após receber as informações sobre sua lesão, o atleta precisa começar a se organizar e a estabelecer metas e objetivos de trabalho e recuperação. Os objetivos de recuperação determinam o grau de melhora que o sujeito espera alcançar em um determinado período de tempo. Eles criam uma escala de evolução do tratamento, permitindo ao sujeito acompanhar o desenvolvimento de sua reabilitação e a recuperação de suas capacidades físicas. Como exemplo, podemos citar objetivos como: andar em uma semana, correr em um mês, saltar em três meses e retornar às atividades normais em quatro meses.
Estes objetivos desviam o foco do atleta do resultado de suas ações para a importância de realizá-las. Assim, busca-se evitar a ansiedade da espera pelo resultado, concentrando o sujeito no que realmente é relevante neste momento do processo e motivando-o com o cumprimento de cada tarefa.
Um bom trabalho de estabelecimento de metas permite, portanto que, a cada conquista de objetivos o atleta obtenha o reforço necessário para se motivar em seu processo de reabilitação, focando-se no próximo objetivo e no melhor aproveitamento de seus recursos de enfrentamento.
A autoconversação é uma técnica cognitiva importante para desenvolver a autoconfiança, normalmente comprometida durante o processo de recuperação. Através dela, os atletas buscam substituir os pensamentos negativos por pensamento realistas e positivos, melhorando seu ponto de vista perante a lesão. Através das técnicas de auto-fala o sujeito procura corrigir pensamentos disfuncionais, reestruturando seus conceitos sobre a lesão e o processo de recuperação, assumindo uma perspectiva mais positiva na reabilitação.
Deste modo, a autoconversação aumenta o bem-estar pessoal, ajuda o atleta a se concentrar e a superar possíveis dificuldades, encarando-as como parte do processo de cura, o que facilita o ajuste do sujeito a esta nova situação, na busca por uma melhora clínica.
Os exercícios de visualização, imaginação e treinamento mental também exercem um importante papel dentro das técnicas de coping dos atletas lesionados. Eles são importantes porque permitem aos estes atletas diminuir as defasagens técnicas, táticas e cognitivas, causadas pelo afastamento de sua prática esportiva normal. Existem diferentes exercícios de visualização, que são aplicados de acordo com os objetivos específicos de cada técnica. Visualizar a realização dos gestos motores, situações de jogo e a recuperação dos tecidos lesionados são apenas alguns exemplos de suas possibilidades.
As técnicas de relaxamento também têm sido muito utilizadas no desenvolvimento das estratégias de coping, se constituindo como um elemento importante neste tipo de trabalho. Além de preparar os atletas para posteriores exercícios de visualização, estas técnicas também atuam no controle da dor e na diminuição do estresse inerente às lesões esportivas e sua recuperação.
Os exercícios de relaxamento, por sua capacidade de psicorregulação, atuam no equilíbrio do sistema nervoso autônomo, diminuindo a ativação do sistema nervoso simpático e aumentando as ações parassimpáticas. Deste modo o relaxamento contribui para uma diminuição no nível geral de tensão e estresse, no relaxamento muscular e na melhora do padrão de sono dos sujeitos.
O apoio social também é parte do processo de coping e pode influenciar a resposta da reabilitação da lesão esportiva, estando positivamente relacionado com o desempenho dos atletas. Este apoio que abrange características como auxílio nas tomadas de decisão, apoio em suas escolhas, motivação, apoio emocional e uma sensação de não estar sozinho, assume um importante papel na diminuição dos níveis de estresse e nas respostas positivas de adesão ao tratamento.
Diante de todos estes fatores apresentados, o desenvolvimento das estratégias de enfrentamento dos atletas lesionados se tornou imprescindível em qualquer programa de reabilitação. O trabalho da psicologia do esporte demonstra, através do desenvolvimento das técnicas de coping, se constituir como um importante elemento não apenas para acolher e trabalhar as questões emocionais geradas pelas lesões esportivas, mas para atuar diretamente em sua recuperação.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Joaquim Cruz, Estratégias de Preparação Psicológica

Excelente leitura para todos os interessado na Psicologia do Esporte e nas histórias de vida dos grandes atletas.

Mais do que uma simples biografia, a autora Kátia Rubio apresenta através da carreira, das conquistas e das superações deste grande atleta, as estratégias psicológicas utilizadas por Joaquim Cruz ao longo de sua carreira.

Os conceitos são apresentados na prática, através dos relatos do atleta e fundamentados teóricamente pela autora, que discute aspectos como motivação, superação, persistência, enfrentamento de lesões, controle da ansiedade e medo, concentração, foco e transição de carreira.

Através dos relatos e análises presentes no livro, Joaquim Cruz mostra porque foi um dos maiores atletas do atletismo do Brasil e do Mundo, coroando sua carreira com a medalha de ouro nos jogos olímpicos de Los Angeles em 1984.

Desenvolvendo suas habilidades psicológicas de forma intuitiva, Joaquim se utilizou de inúmeras técnicas discutidas e aplicadas por psicólogos do esporte do mundo todo nos dias de hoje, mostrando que no esporte de alto nível um bom preparo psicológico é fundamental.

Joaquim Cruz, Estratégias de Preparação Psicológica: da prática a teoria
Autora: Kátia Rubio
Editora: Casa do Psicólogo

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O Papel do Líder

No post anterior sobre liderança, falei um pouco sobre a importância da liderança e do papel do líder nas equipes de modalidades individuais. Também foi discutida a importância de se conhecer o grupo e de dar atenção às relações interpessoais, cuidando para que os objetivos individuais possam ser alcançados, contribuindo desta forma para o objetivo final da equipe.
Mas de que forma este processo se desenvolve e quais características precisam ser desenvolvidas pelo líder para alcançar estes resultados?
Diversas são as teorias que tratam da questão, enfatizando um ou outro aspecto do processo do líder, do grupo ou das situações vivenciadas. As principais, entretanto são as que compreendem este fenômeno como um processo que engloba cada uma destas vertentes.
Uma liderança efetiva dependerá, portanto, dos fatores situacionais envolvidos na tarefa, das características específicas do grupo liderado, das capacidades do líder e da forma como ele exerce esta liderança.
Os fatores situacionais estão relacionados ao momento vivido pela equipe, às tarefas que tem de desempenhar, a competição que está pela frente, as expectativas internas e externas de resultado, sua representação perante mídia, público e adversários e as dificuldades e tensões vivenciadas pela equipe.
Submetidos a estas situações está o grupo, formado por indivíduos com diferentes necessidades, metas, sonhos desejos e graus de maturidade e dependência. Embora a própria formação de um grupo já desenvolva características comuns e forme uma identidade própria, principalmente nos esportes individuais as características pessoais não podem ser ignoradas, o que aumenta a necessidade de atenção constante do líder sobre o grupo.
Para isso este líder deve desenvolver suas capacidades de percepção, comunicação, empatia e influência sobre os membros do grupo, no sentido de organizar e direcionar as ações individuais em função dos objetivos estabelecidos.
Assim, as atitudes do líder devem considerar todos estes aspectos, e vai depender deles para serem realmente efetivas. Não podemos dizer que a liderança ideal é democrática, com foco nas necessidades pessoais e com as responsabilidades compartilhadas, quando temos um grupo imaturo e dependente, um período curto e um grande desafio ou objetivo pela frente acompanhada de enorme pressão externa e insegurança interna. Também não podemos nos fixar nos paradigmas de liderança autoritária, foco exclusivamente na tarefa e centralização da responsabilidade na figura do líder quando temos uma equipe extremamente experiente e articulada, frente a um desafio adequado às capacidades do grupo. Em ambos os exemplos a liderança irá falhar, seja pela falta da figura do líder, perdida no meio da inconsistência dos comportamentos do grupo, seja pelo descrédito dado ao papel da liderança, forçada sobre um grupo ativo e capaz.
O líder, portanto, deve adequar sua atuação e sua influência às características do grupo. Quanto maior a capacidade e independência dos liderados, menor será a influência direta do líder, que irá assumir uma postura de direcionar as ações e compartilhar as decisões, influenciando o grupo de forma positiva e atuando mais como referência e apoio, fortalecendo a coesão e a motivação do grupo, para a realização de tarefas e o cumprimento dos objetivos.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Lesões Esportivas e a Psicologia do Esporte - Parte 2

Não podemos ignorar a importância dos fatores psicológicos envolvidos no contexto das lesões esportivas. Pricipalmente dentro da compreensão do sujeito como um ser biopsicosocial, onde os fatores físicos e psicológicos interagem influenciando o estado geral do sujeito e sua capacidade de enfrentamento e recuperação.
A partir desta visão, a psicologia do esporte passou a se preocupar em estudar a influência das habilidades psicológicas e de fatores como o estresse e a ansiedade na ocorrência das lesões esportivas, buscando um melhor entendimento deste fenômeno através do desenvolvimento de teorias relacionadas à psicologia das lesões esportivas.
Diversos estudos foram então desenvolvidos, buscando encontrar correlações entre fatores como personalidade, características individuais, repertórios de enfrentamento e influências ambientais sobre os sujeitos e a incidência de lesões em atletas, na tentativa de identificar os principais fatores desencadeantes.
Uma das principais teorias a respeito da determinação das lesões é a de que sua ocorrência seja favorecida por um aumento no nível de estresse do atleta, causado pela diferença entre as percepções de ameaça do meio e os recursos internos do sujeito, disponíveis para enfrentá-las (Andersen e Williams, 1988; Heil, 1993). Um sujeito com poucos recursos para o enfrentamento de situações potencialmente estressantes, conseqüentemente as perceberá como mais ameaçadoras e terá seu nível de ansiedade aumentado.
O nível de ansiedade dos atletas é, portanto resultado da interação entre diferentes estímulos presentes na relação do atleta com o ambiente esportivo do qual faz parte. Entre os fatores que geram ansiedade, podemos citar a presença de elementos estressores no ambiente, a percepção e a interpretação do sujeito acerca destes, as alterações psicofisiológicas decorrentes desta interação e o repertório do sujeito de estratégias de enfrentamento para lidar com tais estímulos.
Uma dura rotina de treinamentos, que no esporte competitivo exige grande esforço em termos de volume e intensidade, repetição exaustiva de ações e gestos específicos e condições físicas de treinamento nem sempre adequadas (como instalações, pisos e material esportivo inadequado), acaba gerando respostas ansiógenas no indivíduo, fisicamente exigido perto do seu limite de resistência.
Além das exigências físicas, fatores psicológicos como insegurança, autocobrança excessiva, disputa por posições na equipe e medo de ficar na reserva ou não alcançar um índice, freqüentemente presentes entre os atletas inseridos em um ambiente competitivo, também interferem na percepção das capacidades de enfrentamento do sujeito, favorecendo também o aumento da ansiedade.
Devido à exposição a todos estes estímulos, e a pressão constante exercida nos atletas durante sua preparação, além do fato de que a maior parte do tempo do atleta, e conseqüentemente de seu desgaste, é despendido durante os treinamentos, estes acabam sendo identificados como ambientes altamente estressantes e acabam responsáveis pela ocorrência da maioria das lesões (Buceta 1999).
Apesar de toda a exigência dos treinos, o momento da competição ainda é tido como um dos principais fatores ansiógenos em atletas competitivos. Isto porque é no momento da competição que toda a exigência de rendimento se faz presente e, independente do que ocorreu nos treinos, é durante a competição que o atleta tem que desempenhar o melhor de sua performance esportiva, resultando em um aumento na intensidade do esforço físico e psicológico. A necessidade de apresentar seu rendimento máximo, a avaliação permanente e direta de sua performance pelo técnico, colegas de equipe, amigos e torcedores, a necessidade de tomadas de decisão constantes, de concentração total durante longos períodos de tempo, e o valor aumentado das conseqüências de cada comportamento emitido pelo atleta, são apenas alguns exemplos que demonstram a presença de potenciais fatores de estresse no momento das competições (Buceta 1999; Dias, Palha & Cruz 1997).
Entretanto, o que vai determinar o aumento da ansiedade é a interpretação que cada sujeito dá para os estímulos apresentados pelo ambiente. Atletas experientes, confiantes e mais preparados psicologicamente tendem a interpretar os estímulos ambientais como menos ameaçadores, apresentando poucas respostas de ansiedade.
Segundo a teoria da influência do estresse nas lesões esportivas de Andersen e Williams (1988), a lesão aparece como resultado da interação entre as situações potencialmente estressantes do ambiente e as variáveis pessoais de cada sujeito, como os fatores de personalidade, a história individual dos sujeitos em relação aos estressores e seu repertório de recursos de controle. Uma interação positiva favoreceria o controle do atleta frente a situações estressantes, diminuindo o risco de lesões, enquanto uma interação negativa acabaria favorecendo reações e condutas inadequadas do atleta, aumentando este risco.
Dentre os fatores de personalidade que influenciam a interpretação do sujeito e sua conduta diante das situações estressantes estão o estresse psicosocial, a atenção, a agressividade, a impulsividade, a autoconfiança, a auto-estima, a persistência, a tolerância à frustração e adversidade, o estado de ânimo, a comunicação interpessoal e a capacidade de tomada de decisões.
A história individual pode determinar o desenvolvimento de respostas ansiógenas no sujeito a medida em que experiências anteriores de exposição a situações de estresse, vividas com sucesso pelo sujeito aumentam sua autoconfiança e percepção de capacidades de enfrentamento, diminuindo as respostas de ansiedade diante de estímulos estressores, enquanto um histórico de fracasso frente a estes estímulos prejudica a interpretação da situação por parte do atleta, elevando os níveis de ansiedade e medo, e favorecendo o aparecimento de lesões.
Um bom repertório de enfrentamento também contribui para a diminuição nos níveis de ansiedade e de ocorrência de lesões nos sujeitos, uma vez que o atleta bem preparado psicologicamente, dominando diferentes estratégias de enfrentamento e contando com um apoio social adequado, tem instrumentos suficientes para preservar sua integridade física e psicológica durante a presença de estímulos estressores, interpretando-os como menos ameaçadores do que os atletas que não contam com este repertório (Andersen e Williams 1988; Dias, Palha & Cruz 1997).
A interação destes fatores pode, portanto determinar a ocorrência de lesões uma vez que as respostas ansiógenas dos sujeitos frente a estímulos estressores provocam diversas alterações fisiológicas e comportamentais que influenciam a qualidade e a percepção dos movimentos e ações esportivas e a capacidade de recuperação do organismo, aumentando o desgaste físico e a vulnerabilidade destes atletas(Andersen e Williams, 1988; Buceta, 1999; Samulski, 2002; Weiberg e Gould, 1999).
As alterações comportamentais geradas pelo aumento da ansiedade estão relacionadas principalmente aos níveis de atenção e prontidão dos indivíduos, que tem seus estados alterados quando sob estresse, dificultando a interpretação de situações de jogo, as tomadas de decisão e a percepção das ameaças externas as quais estão expostos dentro do ambiente competitivo (Buceta, 1999; Andersen e Williams, 1988).
Atletas submetidos a situações estressantes por um longo período de tempo apresentam maiores níveis de ansiedade competitiva e tem sua capacidade de controle de foco alterada, desenvolvendo dificuldades na seleção dos estímulos relevantes do ambiente, que se traduzem em rupturas e lapsos de atenção. Em uma atividade competitiva que exige altos níveis de concentração em função do desempenho e da correta realização de técnicas específicas da modalidade, sob a ameaça constante de lesões em função da intensidade das cargas aplicadas, desvios de atenção podem fazer com que o atleta realize movimentos inadequados, sobrecarregando as estruturas envolvidas na ação, ou não perceba ameaças externas como condições ambientais inadequadas (ex. irregularidades no piso) ou a aproximação de adversários desleais, aumentando os riscos de ocorrência de lesões traumáticas (Buceta, 1999; Samulski, 2002; Weiberg e Gould, 1999).
Características pessoais também contribuem para o aumento na ocorrência de lesões esportivas. Atletas que apresentam condutas insensatas, isto é, condutas que trazem prejuízo importante para seu rendimento físico, dano para sua própria estrutura biológica ou risco de lesão de outros atores do contexto esportivo, como distorções na percepção e avaliação da realidade competitiva ou de treinamento, extrema dependência psicológica e financeira da produtividade do rendimento esportivo, e dificuldade na análise e elaboração de sua própria realidade, associados a altos níveis de impulsividade também estão mais vulneráveis as lesões esportivas (Soler 1997).
Isto ocorre uma vez que estes atletas tendem a avaliar as ameaças do ambiente esportivo de forma inadequada, se expondo a riscos desnecessários durante a prática de suas atividades em virtude de falhas na interpretação dos estímulos do ambiente, ou muitas vezes estimulados pelas características motivacionais do contexto esportivo, que também podem favorecer a ocorrência de lesões a medida em que as conseqüências da atividade esportiva acabam se tornando atrativas a ponto de valerem o risco da exposição a situações perigosas, dificultando uma adequada consideração sobre os riscos e benefícios da atividade.
Diante desta visão, a psicologia do esporte tem desenvolvido diversas estratégias de controle destes elementos estressores do ambiente, na tentativa de minimizar os efeitos negativos destes sobre os atletas. Ela trabalha muitas vezes com instrumentos cognitivos e comportamentais, desenvolvendo as capacidades do sujeito em enfrentar as dificuldades. Estas estratégias são conhecidas como estratégias de enfrentamento ou coping.


domingo, 20 de setembro de 2009

Lesões Esportivas e a Psicologia do Esporte - Parte 1

No contexto do esporte de alto rendimento, encontramos diversas ameaças à integridade física e psicológica do atleta durante todo período de sua carreira atlética. Condições de treino e competição ruins, adversários desleais, grande exigência física, cobrança interna e externa por resultados, dúvidas e medos são fatores constantes, que muitas vezes acabam responsáveis pela queda do rendimento dos atletas, podendo levá-los, inclusive, ao abandono de suas atividades físicas competitivas.
Como presentes ameaças, as lesões esportivas exercem uma grande influência no afastamento e abandono dos atletas de suas atividades competitivas. Diversas notícias e dados estatísticos confirmam a cada ano um alto grau de ocorrência de lesões e seu grande impacto na vida dos atletas, sejam eles recreativos ou de alto rendimento (Kraus e Conroy, 1984; Weinberg e Gould, 2001; Engstrom et al., 1990; Samulski, 2002). (ver anexo1).
Em função do desenvolvimento de estudos mais específicos na área das ciências do esporte e da mudança da visão de treinadores e dirigentes e profissionais envolvidos no meio esportivo, o bem estar biopsicosocial começou a ser percebido como importante influência no rendimento final dos atletas. Dentro desta visão as lesões esportivas também passaram a ser consideradas não apenas como um fenômeno físico de estresse e desgaste mecânico, mas como algo que se não é causado por fatores psicológicos, exerce uma grande influência sobre o estado emocional dos atletas sujeitos às lesões.
A psicologia do esporte passou então a dedicar grande atenção aos estudos relacionados às lesões esportivas, na tentativa de compreender melhor o fenômeno das lesões esportivas e contribuir com a prevenção e o tratamento destes atletas.
Diversos aspectos envolvidos no processo da lesão também foram considerados de forma mais específica, ampliando a área de atuação da psicologia do esporte para além do apoio psicológico dos aspectos emocionais dos sujeitos.
Entre os principais focos dos estudos com lesões esportivas, na área da psicologia do esporte, podemos citar a compreensão do fenômeno da lesão, o estudo dos processos emocionais presentes nos atletas lesionados e as intervenções psicológicas com estes atletas.
Dentro da compreensão do fenômeno, os estudos baseados na teoria de Andersen e Williams (1998) sobre a influência do estresse nas lesões trouxeram uma grande contribuição para a área, na medida em que começaram a ser consideradas a importância e a influência dos fatores psicológicos na ocorrência das lesões. Foi então estudado o papel de fatores como o medo, a ansiedade e o estresse nos aspectos mentais e corporais, contribuindo para a ocorrência das lesões.
O estudo dos processos emocionais envolvidos nas lesões contribuiu para uma melhora na compreensão da emoções desencadeadas nos atletas, em função da súbita privação de sua atividade competitiva normal. Aspectos como transformação e adaptação da identidade, reações de raiva e depressão, e aspectos da vivência do luto e da morte presentes nos estudos da tanatologia acabaram incorporados nestes estudos.
As intervenções psicológicas se constituíram como a grande evolução no trabalho da psicologia do esporte com as lesões esportivas. Estas intervenções começaram então a ser reconhecidas como influenciadoras diretas do nível de melhora dos atletas. Isto é possível a medida que apresentam a capacidade de contribuir para a diminuição das reações negativas, tornando o sujeito mais ativo e empenhado em seu processo de recuperação, melhorando sua qualidade de vida, mantendo-o mais motivado e podendo, conseqüentemente, contribuir na aceleração dos protocolos de reabilitação.
Desta forma a psicologia do esporte trabalha no contexto das lesões esportivas dentro dos mesmos parâmetros em que atua na preparação de atletas para o alto rendimento. Podemos assim dividir as intervenções, entre o desenvolvimento das habilidades psicológicas, trabalhadas através dos programas de treinamento mental e o apoio psicológico, referente ao acolhimento e suporte às questões emocionais geradas pela lesão.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Transtornos alimentares no Esporte de Alto Rendimento

Muito tem sido escrito acerca da incidência de transtornos alimentares entre atletas de alto rendimento submetidas a treinamento intenso e a dietas controladas. Isto ocorre na medida em que o esporte se torna exigente com uma série de características específicas criando, além da exigência de performance, um padrão estético que se impõe às suas praticantes, forçando-as a uma adaptação rigorosa. As atletas então, na busca por melhores resultados, ou até por aceitação no grupo se tornam mais propensas a submeter-se a práticas perigosas como a restrição alimentar excessiva ou ao uso de substâncias proibidas.

Estudos comparativos demonstram que os transtornos alimentares são mais recorrentes em atletas, mulheres jovens e relacionados principalmente com as modalidades onde o baixo peso da atleta pode influenciar mais diretamente a sua performance final ou onde os padrões estéticos de magreza ou definição muscular estão mais presentes (Reinking MF, Alexander LE, 2005).
Dados obtidos em pesquisas com outras modalidades demonstram uma prevalência de transtornos alimentares entre atletas do sexo feminino de cerca de 42% em esportes estéticos (ex. ginástica artística, GRD e patinação), de 24% em esportes de endurance (ex. corridas de fundo e triathlon), de 17% em esportes técnicos e de 16% em esportes com bola (Sundgot-Borgen J, Torsteveit MK.2004; Rosen LW, McKeag DB, Hough DO, Curley V. 1986). Estes estudos demonstram a importância do estudo e da compreensão dos transtornos alimentares em esportes de alto rendimento, e do comportamento de suas praticantes diante das exigências cada vez mais duras da competição moderna.
Entre os transtornos alimentares mais comuns podemos citar a Anorexia Nervosa, a Bulimia Nervosa e o comer compulsivo, transtornos relacionados à imagem corporal e ao comportamento alimentar, variando desde a extrema restrição e controle até o total descontrole, fazendo com que as atletas, que a princípio tem seu comportamento reforçado pela perda de peso ou pelo prazer do descontrole, acabem trazendo sérios prejuízos para sua performance e principalmente para sua saúde.
Estes transtornos também costumam estar associados a características específicas de comportamento como maiores níveis de ansiedade, hostilidade e isolamento e menores níveis de socialização se compararmos mulheres com e sem distúrbios alimentares (Augestad LB, Saether B, Gotestam KG.1999).

A Anorexia Nervosa é caracterizada por uma limitação dietética auto-imposta e padrões bizarros de alimentação com acentuada perda de peso, induzida e mantida pela paciente, associada a um temor intenso de tornar-se obesa (Busse et al, 2004), conseqüências de distorções na imagem corporal, onde a pessoa se percebe gorda independentemente do que vê no espelho ou de dados objetivos como peso e medidas. Ela passa então a recusar alimentos ou escondê-los, na tentativa de perder cada vez mais peso na busca por um ideal inalcançável de corpo.

A Bulimia Nervosa, outro transtorno alimentar comum, embora compartilhe da mesma psicopatologia da Anorexia é mais caracterizada pelo descontrole alimentar com um grande sentimento de culpa associado. Neste caso a pessoa tem episódios irresistíveis de hiperfagia (também chamados de binge), onde pode chegar a consumir até 5000 calorias em uma única refeição e depois, arrependida e culpada pelo grande medo de engordar, provoca vômitos ou se utiliza de laxantes e diuréticos para eliminar o que foi consumido, “tentando neutralizar os efeitos engordativos dos alimentos”, na busca pela reparação de seu comportamento.

O comer compulsivo embora seja um transtorno menos prejudicial à saúde, pelo menos a curto e médio prazo, traz sérias conseqüências quando falamos de atletas de alto rendimento, que necessitam estar no melhor de sua forma física para a prática esportiva. A incapacidade em controlar compulsões e desejos, que normalmente estão relacionados a grandes quantidades de comida, se constituindo em sua maioria por doces e gorduras, acaba favorecendo o aumento de peso, influenciado principalmente pelo acúmulo de gordura corporal, que se por um lado pode favorecer a flutuação das atletas, por outro dificulta a sua mobilidade, prejudica o preparo físico e predispõe a ocorrência de lesões, além de afastá-la dos padrões estéticos e físicos da modalidade.

Diante destes transtornos, se faz necessária uma atenção constante por parte da equipe técnica, pais e atletas, inseridos em modalidades esportivas com tais predisposições, para situações que possam demonstrar a presença destas patologias, facilitando o diálogo e aumentando o apoio e a capacidade de enfrentamento de possíveis dificuldades pelas atletas.

Precisamos, entretanto tomar cuidado ao realizar diagnósticos e distinções uma vez que atletas constituem uma população única e o impacto de fatores como treinamento, padrões alimentares, dietas, restrições calóricas e perfil psicológico devem ser avaliados de forma distinta da população normal (Sundgot-Borgen J, Torstveit MK, Skarderud F. 2004), uma vez que a prática competitiva exige das atletas um esforço real e necessário para obter condições de competir de forma estética e eficiente.

Enfim, para os técnicos é fundamental a atenção para quedas na performance, dificuldade de concentração, isolamento e agressividade das atletas, associadas a importantes perdas de peso, favorecendo um diálogo compreensivo, no sentido de oferecer apoio e favorecer o diálogo no enfrentamento dos problemas, além de discutir com os pais da atleta acerca de possíveis preocupações.
Para os pais é importante notar mudanças no padrão alimentar, preocupação excessiva com o peso, perda acentuada de peso, isolamento e sintomas depressivos e de hostilidade, e buscar o apoio de um profissional especializado, ou de programas específicos para que o tratamento possa ser mais adequado.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

O papel da liderança nos esportes individuais

Já é sabida a importância do papel do líder nos esportes coletivos e sua influencia sobre o comportamento dos demais membros da equipe e o rendimento das tarefas grupais. Entretanto pouco se têm discutido a respeito do papel da liderança em modalidades individuais, seus benefícios, dificuldades e sobre seus processos de surgimento e desenvolvimento.
Geralmente, nestas modalidades os atletas até podem treinar em grupo, mas se comportam como se estivessem sozinhos nos momentos de preparação e competição, usando seus companheiros apenas como parâmetros de rendimento ou como simples companhia durante as sessões de treinamento. Os atletas passam então a se perceber de forma isolada, sem nada a acrescentar ao outro e sem nada a absorver de fora.
São poucas as equipes que trabalham de forma mais unida e sinérgica, com o objetivo de melhorar a performance final de cada um de seus membros. Isto ocorre, pois apenas uma percepção mais ampla das relações interpessoais e suas influências, permite a equipe desenvolver formas de potencializar a contribuição de cada um, para o proveito de todos, criando algo a mais do que a simples soma das partes.
Neste momento surge a discussão sobre o papel da liderança e suas influências no comportamento grupal. O líder tem a função de organizar e direcionar os esforços individuais dentro do grupo, buscando alcançar o máximo de dedicação e aplicação em busca dos objetivos finais do grupo. A grande diferença neste papel é que no caso das modalidades individuais, ao contrário das coletivas, a realização do objetivo final da equipe não depende da submissão dos objetivos individuais, mas deles depende, uma vez que é da soma dos resultados individuais que consistirá o resultado final de uma equipe.
O líder, ou os líderes destas equipes têm então diferentes papeis e funções a desempenhar. Dentre estas funções podemos destacar duas grandes formas de liderança. A primeira delas é a instrumental, voltada para a tarefa, na qual o líder motiva, orienta e pode ser um exemplo para os demais membros do grupo, em relação aos aspectos práticos da modalidade. Isto é, em relação ao desempenho e a performance em treinamentos e competições. Pode ser o melhor, o mais dedicado, que chega mais cedo, que “puxa” o treino ou que o comanda. A segunda forma é a liderança afetiva, mais voltada para as relações pessoais entre os membros do grupo, na qual o líder é responsável pela comunicação e compreensão interpessoal, promove e facilita a criação de um ambiente melhor, motivando e apoiando as realizações individuais dentro do aspecto emocional do grupo.
Nos esportes individuais muitas vezes estes papeis são centralizados pelos técnicos, que deixam aos atletas apenas a função de realizadores, ou são ignoradas, existindo apenas várias relações técnico-atleta. Entretanto, lideranças efetivas dentro do grupo têm muito a contribuir com o rendimento de todos, favorecendo a manutenção de comportamentos de alto nível, mantendo altos os níveis de motivação e proporcionando um ambiente emocional favorável, criando sentimentos de força e capacidade, decorrentes da união do grupo.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Cotidiano

Por Daniela Panisi Oliveira

Quando falamos em vida, subitamente, sem ao menos nos darmos conta disso, vem-nos a ideia de movimento. No mundo de possibilidades, em uma sociedade que vende a imagem de que tudo é possível, como lidar com nossas próprias limitações? Com nossas impotências perante os outros e o mundo? Com os limites de nosso próprio corpo?
Apesar de nos venderem a ideia de que somos ilimitados, super-homens e mulheres maravilhas, podemos “funcionar” (como máquinas), durante mais ou menos 24 horas por dia. Dormir é perda de tempo, por isso tentamos descansar apenas o que é, fisiologicamente, necessário. Não...não ”apenas”, mas o MINIMAMENTE necessário. Temos que funcionar! Essa é a nova ordem mundial.
Todavia, o corpo, este que habita o mundo e nos permite estar aqui, constantemente nos lembra que estamos vivos, que somos demasiado humanos para não ter limites e defeitos.
Uma perna mais curta, um desvio na coluna, o jeitinho de correr que tensiona mais uma musculatura que a outra, dores nas articulações por causa do impacto, entre outras limitações de que tanto nos queixamos, nada mais é senão a simples prova de que estamos vivos, e especialmente de que pouco nos conhecemos.
Desconhecemos nossa capacidade de lidar com o imprevisto, assim como a criatividade inerente ao conhecimento. Desconhecemos o momento de parar, e então superamos a dor. Não reconhecemos a condição mais humana de, simplesmente, sentir o frenesi, o orgulho de ter chegado até ali e percorrido grande parte do caminho.
A excelência de sermos o que somos não está em sermos super-heróis, mas em sermos o melhor que podemos para enfrentar os desafios que a vida nos oferece.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Perguntas Frequentes em Psicologia do Esporte

Por que é tão difícil se manter motivado para treinar para uma prova muito distante?

Uma das maiores dificuldades psicológicas no treinamento esportivo é a capacidade em se manter motivado durante longos períodos de tempo. Isto ocorre, pois o objetivo final, que recompensará todo o esforço e dedicação do atleta, algumas vezes está muito distante. Já as prioridades e exigências do dia a dia estão sempre mudando.
A motivação está, portanto diretamente relacionada ao objetivo final. Quanto mais importante é este objetivo para o atleta e mais próxima a competição, maior é o poder de controle sobre seu comportamento.
Entretanto quando o objetivo está muito distante é comum o atleta dispersar o foco e trocar o desconforto dos treinos (principalmente os longos, em horários desconfortáveis e nos dias frios) por atividades que lhe tragam recompensas imediatas como sair, comer ou ficar dormindo em casa.
Se em um primeiro momento esta troca reforça e alivia o atleta de suas obrigações com o objetivo final, por outro lado pode desencadear um processo de ansiedade, trazendo um sentimento de culpa, que pode levar a excessos posteriores ou a falta de confiança em seu treinamento.
Para lidar com isto o atleta precisa então, constantemente reforçar seus objetivos, aproximando-os de sua realidade atual através das metas de curto e médio prazo, o que irá facilitar a troca das recompensas imediatas por uma muito maior de longo prazo.


Ansiedade pré-competitiva atrapalha minha prova?

Normalmente costumamos associar a ansiedade a um estado desagradável de desconforto, acompanhado de sintomas como taquicardia, mãos suadas ou frias e pensamentos de dúvida e insegurança. Por estes motivos muitas vezes atribuímos a ela as falhas e deficiências em nossa performance.
O que muitos não sabem é que a ansiedade não é necessariamente negativa e nem precisa ser interpretada como sinal de resultados ruins. Isto porque a ansiedade a princípio é uma reação instintiva do ser humano, positiva, e que mobiliza a mente e o corpo para os desafios que o sujeito precisa enfrentar.
Em um nível ideal ela ajuda o atleta a manter-se concentrado e motivado, mobiliza as reservas energéticas do corpo e ativa a liberação de hormônios como o cortisol e a adrenalina, fundamentais para o desempenho físico.
O problema ocorre quando a avaliação do sujeito sobre sua capacidade de enfrentar o desafio que está por vir é negativa. Surgem então as dúvidas e a insegurança. O atleta passa a se sentir incapaz, os sintomas desagradáveis aumentam, a concentração diminui e todas as dificuldades encontradas na prova são atribuídas a este estado.
Neste momento a ansiedade passa a trabalhar contra o atleta e o desempenho pode ser diretamente afetado.
Desta forma um controle não apenas somático, das reações da ansiedade, mas principalmente cognitivo, da avaliação das situações e causas da ansiedade, alivia os sintomas negativos e coloca toda a energia do atleta para trabalhar de forma produtiva para o desempenho.


De que forma a “parte psicológica” pode influenciar na performance?

Diversas vezes ouvimos falar sobre a importância da preparação psicológica de atletas, mas ainda parece difícil a compreensão dos mecanismos psicológicos que influenciam seu desempenho final.
A psicologia do esporte tem se dedicado a duas formas específicas de trabalho com os atletas, visando influenciar diretamente sua performance. A principal é através do desenvolvimento de habilidades mentais competitivas específicas.
Aspectos como atenção e concentração podem ser decisivos para modalidades onde a precisão e a velocidade de reação são mais determinantes. Uma boa capacidade em se manter motivado melhora a qualidade do treinamento para provas de preparação muito exigente. O controle da ansiedade e dos níveis de ativação do atleta permite uma regulação ótima destes estados, favorecendo o uso econômico da energia disponível e a utilização máxima das capacidades cognitivas do atleta durante sua prova.
Outro ponto bastante desenvolvido nos últimos tempos ainda atua mais diretamente sobre as capacidades físicas do atleta. È a chamada psicofisiologia, que desenvolve o controle e a interface entre as características psicológicas e fisiológicas do atleta. Através de técnicas específicas como a psicorregulação, o biofeedback e os treinamentos mentais, é possível atuar diretamente sobre aspectos como a economia no consumo de oxigênio, a recuperação do treinamento e o controle muscular específico de movimentos, entre outros.
Por fim, não podemos esquecer a importância biopsicosocial do esporte na vida dos atletas e a forma como lazer, competição, superação, estilo de vida e relações interpessoais interagem na constituição dos sujeitos, fazendo da boa relação com o esporte um meio de vida mais saudável e produtivo para todos.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

O Esporte Democrático

Na semana passada, durante as transmissões do campeonato mundial de atletismo, eu me deparei algumas vezes com um comentário peculiar e muitas vezes comum não apenas em transmissões deste tipo, mas em conversas e discussões sobre o tema.
O comentário em questão dizia que o atletismo era belo por ser um esporte democrático, onde países e atletas pobres também podiam se destacar.
Pois bem, o pensamento que este comentário me despertou foi o de que esta colocação carregava consigo um preconceito implícito. O preconceito de que estes atletas são beneficiados pela condição do esporte e não por serem os melhores, resultado de treinamento, capacidade e genética, que os torna tão elitistas quanto os atletas de qualquer outra modalidade.
Dizer que todos são especiais é o mesmo que dizer que ninguém o é. Dizer que todos tem a mesma oportunidade no esporte é uma ilusão. O esporte inclusive se baseia muito mais na desigualdade do que na igualdade. É sobre quem é o mais desigual, o que se diferencia da média, o melhor.
O treinamento, a alimentação, a preparação, os recursos. Tudo isso tem a função de fazer o atleta se sobresair em relação a seus adversários. A questão da igualdade tem de residir apenas em garantir que os atletas compitam sob as mesmas condições (pistas, quadras e piscinas) e sob as mesmas regras.
A partir disso o esporte cresce e se desenvolve apenas quando as condições de se diferenciar são garantidas aos atletas.
O atletismo então, também muito em função da diversidade de provas e exigências de capacidades físicas distintas em cada uma delas, favorece diferentes características, encontradas em diferentes povos e nações. Entretanto, como esporte, ele ainda privilegia os mais treinados, mais dedicados e mais capazes e eficientes, independente da modalidade mas, ainda sim, extremamente dependentes das condições de treinamento (financeiras, de estrutura e de conhecimento técnico), sejam para jamaicanos, quenianos ou norte americanos.

Limites - A natação mundial e os novos trajes

No esporte competitivo de alto rendimento, os limites estão constantemente presentes, se constituindo como principal ponto de referência a todos os competidores. Eles determinam a diferença entre o real e o irreal, entre o possível e o impossível e entre o sonho e a realização.
Estes limites podem ser vitórias, tempos, distâncias ou um número de pontos. Diversos também podem ser os referenciais, assim como diversas podem ser as barreiras. Treinamento, preparação física, condições fisiológicas, psicológicas, cognitivas e emocionais, dos atletas e seus adversários constituem os limites que são constantemente forçados para cima, até atingirem seu ápice, os Recordes.
Neste último ano, o que temos visto na natação é uma chuva de recordes e grandes marcas pessoais, aos quais se atribuem em grande parte aos novos trajes de competição. Compressão, flutuabilidade e menor atrito é o que prometem os fabricantes. Desigualdade, descaracterização do esporte, bagunça, artificialidade dos resultados é o que pregam os defensores dos conceitos tradicionais (sunga e óculos). Mas a verdade é que hoje é difícil ver um atleta que se propõe a quebrar um recorde ou a vencer uma competição que abra mão destes tais trajes.
Mas além dos critérios técnicos envolvidos temos de olhar por um momento para toda uma transformação que ocorreu na questão psicológica de nossos atletas, principalmente os brasileiros, neste último ano. No alto nível hoje, não se trata mais de jogar a responsabilidade do resultado no traje, de escolher o “caminho mais fácil”, mas sim de assumir a responsabilidade de estar preparado para competir em todos os aspectos envolvidos na competição. Se já é feito o treinamento técnico, o físico, o psicológico, o acompanhamento médico, nutricional, fisioterapêutico, por que ignorar o aspecto tecnológico da prova. Ou alguém ia para alguma seletiva sem polir, ou sem raspar?
Se olharmos para as marcas também observamos pontos interessantes. Vimos marcas caindo dois, três, até mais segundos em algumas provas. Isto depois da introdução dos novos trajes. Se o fabricante viesse prometendo um segundo de melhora com a roupa, onde então estariam os outros segundos? No treinamento, que não sofreu alterações radicais nestes últimos anos? Nos atletas, que continuam os mesmos? Ou em suas cabeças?
A principal contribuição dos trajes, neste último ano, parece ter sido a de tirar a natação de uma zona de conforto. Não que os atletas e treinadores estivessem acomodados, mas estavam acostumados com uma evolução mais lenta e gradual nos tempos, uma referência do que era possível e impossível. Hoje, porém todas as referências foram aniquiladas, os limites desapareceram da cabeça dos atletas, os recordes de repente ficaram em branco esperando para serem reescritos. Com todo respeito a toda a história do esporte, aos heróis e aos chamados atletas artificiais de hoje, mas o esporte tem evoluído e muito em função disto.
Se sentir mais rápido, saber que está mais rápido, saber que todos baixaram seus tempos, que os referenciais ainda estão sendo determinados e que os limites estão frágeis, fazem com que os atletas caiam na água com uma confiança e uma determinação que criam grandes condições para um bom resultado.
O primeiro passo parece então ser o mais difícil. Fazer aquilo que alguém já demonstrou ser possível favorece a repetição de novos feitos. E como exemplo, podemos observar atletas como Michael Phelps em um âmbito mundial e César Cielo no cenário nacional.
Quando Phelps apareceu exterminando os antigos recordes mundiais, acreditava-se que ele era um fenômeno e que suas marcas dificilmente seriam batidas. Ele realmente se provou um fenômeno. Mas mais por sua versatilidade e sua capacidade de vencer diversas provas do que simplesmente por seus tempos. Ele ainda continua sendo recordista da maioria de suas provas, mas muito devido a sua constante evolução, pois aqueles tempos iniciais, que pareciam na época, inalcançáveis já foram a muito batidos por outros atletas.
Podemos ver hoje inclusive, também devido ao fato de Phelps quase ter sido batido na final dos 100m borboleta nos jogos olímpicos de Pequim, que alguns atletas já surgem como potenciais adversários diretos dele em provas que costumava dominar com folga. Isto sem falar nas provas que começou a disputar recentemente, como os 100m livre, e que tem alcançado resultados apenas modestos.
E falando em provas de velocidade, outro exemplo da importância dos referenciais é o impacto da conquista de César Cielo para toda a natação brasileira. Um atleta extremamente dedicado, talentoso e determinado que estabeleceu um novo padrão de qualidade e de viabilidade de grandes resultados para os atletas do Brasil. Cielo mostrou que é possível, que um atleta brasileiro pode disputar de igual para igual uma prova internacional. Que o atleta, sua dedicação e sua confiança, dentro de condições adequadas de treinamento e preparação fazem mais diferença do que o país em que se nasceu.
È claro que discussões a respeito das condições de igualdade podem ser levantadas, questionamentos sobre a transferência da importância dos resultados, dos atletas para os trajes, e até argumentos de perversão do esporte e doping tecnológico acabam aparecendo e ofuscando as performances dos atletas. Mas a questão que não podemos ignorar é a de que: Se alguém, em qualquer condição, já foi capaz de realizar uma performance específica, este desempenho pode ser repetido. Talvez porque o esporte esteja em constante evolução, talvez simplesmente porque os atletas saibam que isso não é mais impossível. Pode demorar anos ou décadas, como os recordes de chinesas e alemãs orientais, através do uso de substâncias proibidas, ou a possível regressão nos resultados após a proibição dos trajes e a volta a sunga, mas que estes recordes com certeza serão novamente batidos eu não tenho dúvidas.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Primeiro Post

Este é o início de um novo espaço, criado para divulgar pensamentos idéias e opiniões acerca de diversos assuntos. Os comentários, apesar de variados giram acerca de um tema principal. O Esporte. A partir dele, resultados, performances, boas notícias, notícias ruins, problemas, treinamento, provas, modalidades e principalmente os temas relacionados a Psicologia do Esporte estarão em discussão.
Não pretendo falar em nome da Psicologia, por isso não coloquei o nome de Blog da psicologia do esporte, ou psicologia do esporte online ou outro parecido. Isso até para me diferenciar dos profissionais que colocam um nome desses e ficam falando besteira e daqui a pouco são chamados até de referência na área.
Assim assumo a responsabilidade pelo conteúdo aqui publicado e espero também, de certa forma, manter sempre atualizado de informaçãoes, utilizando este espaço como um teste da capacidade de divulgação de idéias e conceitos.
Abraço a todos