sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Cotidiano

Por Daniela Panisi Oliveira

Quando falamos em vida, subitamente, sem ao menos nos darmos conta disso, vem-nos a ideia de movimento. No mundo de possibilidades, em uma sociedade que vende a imagem de que tudo é possível, como lidar com nossas próprias limitações? Com nossas impotências perante os outros e o mundo? Com os limites de nosso próprio corpo?
Apesar de nos venderem a ideia de que somos ilimitados, super-homens e mulheres maravilhas, podemos “funcionar” (como máquinas), durante mais ou menos 24 horas por dia. Dormir é perda de tempo, por isso tentamos descansar apenas o que é, fisiologicamente, necessário. Não...não ”apenas”, mas o MINIMAMENTE necessário. Temos que funcionar! Essa é a nova ordem mundial.
Todavia, o corpo, este que habita o mundo e nos permite estar aqui, constantemente nos lembra que estamos vivos, que somos demasiado humanos para não ter limites e defeitos.
Uma perna mais curta, um desvio na coluna, o jeitinho de correr que tensiona mais uma musculatura que a outra, dores nas articulações por causa do impacto, entre outras limitações de que tanto nos queixamos, nada mais é senão a simples prova de que estamos vivos, e especialmente de que pouco nos conhecemos.
Desconhecemos nossa capacidade de lidar com o imprevisto, assim como a criatividade inerente ao conhecimento. Desconhecemos o momento de parar, e então superamos a dor. Não reconhecemos a condição mais humana de, simplesmente, sentir o frenesi, o orgulho de ter chegado até ali e percorrido grande parte do caminho.
A excelência de sermos o que somos não está em sermos super-heróis, mas em sermos o melhor que podemos para enfrentar os desafios que a vida nos oferece.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Perguntas Frequentes em Psicologia do Esporte

Por que é tão difícil se manter motivado para treinar para uma prova muito distante?

Uma das maiores dificuldades psicológicas no treinamento esportivo é a capacidade em se manter motivado durante longos períodos de tempo. Isto ocorre, pois o objetivo final, que recompensará todo o esforço e dedicação do atleta, algumas vezes está muito distante. Já as prioridades e exigências do dia a dia estão sempre mudando.
A motivação está, portanto diretamente relacionada ao objetivo final. Quanto mais importante é este objetivo para o atleta e mais próxima a competição, maior é o poder de controle sobre seu comportamento.
Entretanto quando o objetivo está muito distante é comum o atleta dispersar o foco e trocar o desconforto dos treinos (principalmente os longos, em horários desconfortáveis e nos dias frios) por atividades que lhe tragam recompensas imediatas como sair, comer ou ficar dormindo em casa.
Se em um primeiro momento esta troca reforça e alivia o atleta de suas obrigações com o objetivo final, por outro lado pode desencadear um processo de ansiedade, trazendo um sentimento de culpa, que pode levar a excessos posteriores ou a falta de confiança em seu treinamento.
Para lidar com isto o atleta precisa então, constantemente reforçar seus objetivos, aproximando-os de sua realidade atual através das metas de curto e médio prazo, o que irá facilitar a troca das recompensas imediatas por uma muito maior de longo prazo.


Ansiedade pré-competitiva atrapalha minha prova?

Normalmente costumamos associar a ansiedade a um estado desagradável de desconforto, acompanhado de sintomas como taquicardia, mãos suadas ou frias e pensamentos de dúvida e insegurança. Por estes motivos muitas vezes atribuímos a ela as falhas e deficiências em nossa performance.
O que muitos não sabem é que a ansiedade não é necessariamente negativa e nem precisa ser interpretada como sinal de resultados ruins. Isto porque a ansiedade a princípio é uma reação instintiva do ser humano, positiva, e que mobiliza a mente e o corpo para os desafios que o sujeito precisa enfrentar.
Em um nível ideal ela ajuda o atleta a manter-se concentrado e motivado, mobiliza as reservas energéticas do corpo e ativa a liberação de hormônios como o cortisol e a adrenalina, fundamentais para o desempenho físico.
O problema ocorre quando a avaliação do sujeito sobre sua capacidade de enfrentar o desafio que está por vir é negativa. Surgem então as dúvidas e a insegurança. O atleta passa a se sentir incapaz, os sintomas desagradáveis aumentam, a concentração diminui e todas as dificuldades encontradas na prova são atribuídas a este estado.
Neste momento a ansiedade passa a trabalhar contra o atleta e o desempenho pode ser diretamente afetado.
Desta forma um controle não apenas somático, das reações da ansiedade, mas principalmente cognitivo, da avaliação das situações e causas da ansiedade, alivia os sintomas negativos e coloca toda a energia do atleta para trabalhar de forma produtiva para o desempenho.


De que forma a “parte psicológica” pode influenciar na performance?

Diversas vezes ouvimos falar sobre a importância da preparação psicológica de atletas, mas ainda parece difícil a compreensão dos mecanismos psicológicos que influenciam seu desempenho final.
A psicologia do esporte tem se dedicado a duas formas específicas de trabalho com os atletas, visando influenciar diretamente sua performance. A principal é através do desenvolvimento de habilidades mentais competitivas específicas.
Aspectos como atenção e concentração podem ser decisivos para modalidades onde a precisão e a velocidade de reação são mais determinantes. Uma boa capacidade em se manter motivado melhora a qualidade do treinamento para provas de preparação muito exigente. O controle da ansiedade e dos níveis de ativação do atleta permite uma regulação ótima destes estados, favorecendo o uso econômico da energia disponível e a utilização máxima das capacidades cognitivas do atleta durante sua prova.
Outro ponto bastante desenvolvido nos últimos tempos ainda atua mais diretamente sobre as capacidades físicas do atleta. È a chamada psicofisiologia, que desenvolve o controle e a interface entre as características psicológicas e fisiológicas do atleta. Através de técnicas específicas como a psicorregulação, o biofeedback e os treinamentos mentais, é possível atuar diretamente sobre aspectos como a economia no consumo de oxigênio, a recuperação do treinamento e o controle muscular específico de movimentos, entre outros.
Por fim, não podemos esquecer a importância biopsicosocial do esporte na vida dos atletas e a forma como lazer, competição, superação, estilo de vida e relações interpessoais interagem na constituição dos sujeitos, fazendo da boa relação com o esporte um meio de vida mais saudável e produtivo para todos.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

O Esporte Democrático

Na semana passada, durante as transmissões do campeonato mundial de atletismo, eu me deparei algumas vezes com um comentário peculiar e muitas vezes comum não apenas em transmissões deste tipo, mas em conversas e discussões sobre o tema.
O comentário em questão dizia que o atletismo era belo por ser um esporte democrático, onde países e atletas pobres também podiam se destacar.
Pois bem, o pensamento que este comentário me despertou foi o de que esta colocação carregava consigo um preconceito implícito. O preconceito de que estes atletas são beneficiados pela condição do esporte e não por serem os melhores, resultado de treinamento, capacidade e genética, que os torna tão elitistas quanto os atletas de qualquer outra modalidade.
Dizer que todos são especiais é o mesmo que dizer que ninguém o é. Dizer que todos tem a mesma oportunidade no esporte é uma ilusão. O esporte inclusive se baseia muito mais na desigualdade do que na igualdade. É sobre quem é o mais desigual, o que se diferencia da média, o melhor.
O treinamento, a alimentação, a preparação, os recursos. Tudo isso tem a função de fazer o atleta se sobresair em relação a seus adversários. A questão da igualdade tem de residir apenas em garantir que os atletas compitam sob as mesmas condições (pistas, quadras e piscinas) e sob as mesmas regras.
A partir disso o esporte cresce e se desenvolve apenas quando as condições de se diferenciar são garantidas aos atletas.
O atletismo então, também muito em função da diversidade de provas e exigências de capacidades físicas distintas em cada uma delas, favorece diferentes características, encontradas em diferentes povos e nações. Entretanto, como esporte, ele ainda privilegia os mais treinados, mais dedicados e mais capazes e eficientes, independente da modalidade mas, ainda sim, extremamente dependentes das condições de treinamento (financeiras, de estrutura e de conhecimento técnico), sejam para jamaicanos, quenianos ou norte americanos.

Limites - A natação mundial e os novos trajes

No esporte competitivo de alto rendimento, os limites estão constantemente presentes, se constituindo como principal ponto de referência a todos os competidores. Eles determinam a diferença entre o real e o irreal, entre o possível e o impossível e entre o sonho e a realização.
Estes limites podem ser vitórias, tempos, distâncias ou um número de pontos. Diversos também podem ser os referenciais, assim como diversas podem ser as barreiras. Treinamento, preparação física, condições fisiológicas, psicológicas, cognitivas e emocionais, dos atletas e seus adversários constituem os limites que são constantemente forçados para cima, até atingirem seu ápice, os Recordes.
Neste último ano, o que temos visto na natação é uma chuva de recordes e grandes marcas pessoais, aos quais se atribuem em grande parte aos novos trajes de competição. Compressão, flutuabilidade e menor atrito é o que prometem os fabricantes. Desigualdade, descaracterização do esporte, bagunça, artificialidade dos resultados é o que pregam os defensores dos conceitos tradicionais (sunga e óculos). Mas a verdade é que hoje é difícil ver um atleta que se propõe a quebrar um recorde ou a vencer uma competição que abra mão destes tais trajes.
Mas além dos critérios técnicos envolvidos temos de olhar por um momento para toda uma transformação que ocorreu na questão psicológica de nossos atletas, principalmente os brasileiros, neste último ano. No alto nível hoje, não se trata mais de jogar a responsabilidade do resultado no traje, de escolher o “caminho mais fácil”, mas sim de assumir a responsabilidade de estar preparado para competir em todos os aspectos envolvidos na competição. Se já é feito o treinamento técnico, o físico, o psicológico, o acompanhamento médico, nutricional, fisioterapêutico, por que ignorar o aspecto tecnológico da prova. Ou alguém ia para alguma seletiva sem polir, ou sem raspar?
Se olharmos para as marcas também observamos pontos interessantes. Vimos marcas caindo dois, três, até mais segundos em algumas provas. Isto depois da introdução dos novos trajes. Se o fabricante viesse prometendo um segundo de melhora com a roupa, onde então estariam os outros segundos? No treinamento, que não sofreu alterações radicais nestes últimos anos? Nos atletas, que continuam os mesmos? Ou em suas cabeças?
A principal contribuição dos trajes, neste último ano, parece ter sido a de tirar a natação de uma zona de conforto. Não que os atletas e treinadores estivessem acomodados, mas estavam acostumados com uma evolução mais lenta e gradual nos tempos, uma referência do que era possível e impossível. Hoje, porém todas as referências foram aniquiladas, os limites desapareceram da cabeça dos atletas, os recordes de repente ficaram em branco esperando para serem reescritos. Com todo respeito a toda a história do esporte, aos heróis e aos chamados atletas artificiais de hoje, mas o esporte tem evoluído e muito em função disto.
Se sentir mais rápido, saber que está mais rápido, saber que todos baixaram seus tempos, que os referenciais ainda estão sendo determinados e que os limites estão frágeis, fazem com que os atletas caiam na água com uma confiança e uma determinação que criam grandes condições para um bom resultado.
O primeiro passo parece então ser o mais difícil. Fazer aquilo que alguém já demonstrou ser possível favorece a repetição de novos feitos. E como exemplo, podemos observar atletas como Michael Phelps em um âmbito mundial e César Cielo no cenário nacional.
Quando Phelps apareceu exterminando os antigos recordes mundiais, acreditava-se que ele era um fenômeno e que suas marcas dificilmente seriam batidas. Ele realmente se provou um fenômeno. Mas mais por sua versatilidade e sua capacidade de vencer diversas provas do que simplesmente por seus tempos. Ele ainda continua sendo recordista da maioria de suas provas, mas muito devido a sua constante evolução, pois aqueles tempos iniciais, que pareciam na época, inalcançáveis já foram a muito batidos por outros atletas.
Podemos ver hoje inclusive, também devido ao fato de Phelps quase ter sido batido na final dos 100m borboleta nos jogos olímpicos de Pequim, que alguns atletas já surgem como potenciais adversários diretos dele em provas que costumava dominar com folga. Isto sem falar nas provas que começou a disputar recentemente, como os 100m livre, e que tem alcançado resultados apenas modestos.
E falando em provas de velocidade, outro exemplo da importância dos referenciais é o impacto da conquista de César Cielo para toda a natação brasileira. Um atleta extremamente dedicado, talentoso e determinado que estabeleceu um novo padrão de qualidade e de viabilidade de grandes resultados para os atletas do Brasil. Cielo mostrou que é possível, que um atleta brasileiro pode disputar de igual para igual uma prova internacional. Que o atleta, sua dedicação e sua confiança, dentro de condições adequadas de treinamento e preparação fazem mais diferença do que o país em que se nasceu.
È claro que discussões a respeito das condições de igualdade podem ser levantadas, questionamentos sobre a transferência da importância dos resultados, dos atletas para os trajes, e até argumentos de perversão do esporte e doping tecnológico acabam aparecendo e ofuscando as performances dos atletas. Mas a questão que não podemos ignorar é a de que: Se alguém, em qualquer condição, já foi capaz de realizar uma performance específica, este desempenho pode ser repetido. Talvez porque o esporte esteja em constante evolução, talvez simplesmente porque os atletas saibam que isso não é mais impossível. Pode demorar anos ou décadas, como os recordes de chinesas e alemãs orientais, através do uso de substâncias proibidas, ou a possível regressão nos resultados após a proibição dos trajes e a volta a sunga, mas que estes recordes com certeza serão novamente batidos eu não tenho dúvidas.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Primeiro Post

Este é o início de um novo espaço, criado para divulgar pensamentos idéias e opiniões acerca de diversos assuntos. Os comentários, apesar de variados giram acerca de um tema principal. O Esporte. A partir dele, resultados, performances, boas notícias, notícias ruins, problemas, treinamento, provas, modalidades e principalmente os temas relacionados a Psicologia do Esporte estarão em discussão.
Não pretendo falar em nome da Psicologia, por isso não coloquei o nome de Blog da psicologia do esporte, ou psicologia do esporte online ou outro parecido. Isso até para me diferenciar dos profissionais que colocam um nome desses e ficam falando besteira e daqui a pouco são chamados até de referência na área.
Assim assumo a responsabilidade pelo conteúdo aqui publicado e espero também, de certa forma, manter sempre atualizado de informaçãoes, utilizando este espaço como um teste da capacidade de divulgação de idéias e conceitos.
Abraço a todos